14/12/2025

estrambolado!

estrombolice
que é estrombolice?
ir até onde você estromboliqui-se por vontade própria e depois achar ruim

perceber que assassinou duendes
que não deu de comer a fantasia
que deu de mama pro nada
que lembeu dinheiro
que maltratou a luz do dia. 





entre rubros

vi 
entre as pessoas
bolhas suaves de sangue
que explodiam 
quando elas se aproximavam

quando tentam se aproximar
as pessoas sentem um desconforto muito grande
não conseguem identificar
um frio, uma repulsa, um cheiro estranho
é o sangue das bolhinhas

todo sangue derramado 
flutua ao vento
o sangue da primeira guerra mundial
e das crianças negras
o sangue das baleias






santíssima mãe menina

maria mãe de jesus tinha entre 12 e 16 anos quando ficou grávida

eram outros tempos

tempos melhores

antes das leis, 

antes das gentes frescas...

quando o espírito santo não estava subjugado ao ECA. 





paz na terra

 a cidade morreu, toda a cidade

os mortos foram ressucitados, somente para morrer novamente

somente para que tudo estivesse bem morto

samambaias e skatistas

empacotadores e motoristas

tombados todos dentro do poço sem fundo

meninas de 13 anos prestes a casar, não casarão 

mulheres prestes a serem assassinadas, não o serão

árvores não serão decepadas pelos homens da prefeitura mortos

lixos não serão coletados pelos funcionários subempregados sem pulso

faxineiras não limparam as casas com seus donos já azulados

cachorros e gatos não serão abandonados

nem mais uma criança será esquecida por seu pai sem sopro

os mercados e as lojas não serão assaltados

a cidade morreu

nem deu tempo de desligar as tv´s

eterno será 

o brilho azul na cara dos velhos 

e o céu. 




11/12/2025

diário de bordo

meu pé se emocionou hoje.

fiz exercícios, depois fui dançar em minha barra de pole dance.

troquei os cavalheiros das danças de salão pela barra. ainda sinto falta dos cavalheiros, nada os substitui, mas não é de todo o mal o toque gelado e constância do aço da barra. gosto de coisas que, a menor intenção, ficam vivas às 2h00 da manhã ou em uma quarta qualquer. 

estava dançando. eu queria falar tão bonito que eu estava dançando. o que é dançar. esticas as artérias, virar de ponta de cabeça. torcer as articulações e o sentido do dia. tentar mover os pés mais rápido, dar passos enormes pelo ar, dar passo e acompanhar a rotação da terra. esticar a mão e queimar as pontas dos dedos no sol. estivar a mão e deixar o ar passar pelas costelas. sentir o tempo. dar cambalhotas dentro do tempo, uma cambalhota depois de morrer. 

estava dançando. e pensei em deixar o dedão do pé me levar nos movimentos. pensei que seria algo gradual, aos poucos, o pé tomando seu lugar no mundo, depois de minha permissão. o que aconteceu é que ao primeiro movimento, do meu pé, senti vontade de chorar. ele estava emocionado por experimentar suas asas, queria chorar, tinha olhos, foi pelo ar levando a perna, tão eloquente como um braço, um cisne, um discurso de um pacifista. 

foi um momento comovente, senti vergonha diante da desenvoltura do meu pé independente, que queria desenhar arabescos pelo ar e tocar a terra com cuidado como se a pudesse queimar. 

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estou organizando um projeto de trocas de cartas entre homens, que missão estranha. me sinto observando um mundo desconhecido pelo buraco da fechadura, porque ninguém tem a chave da porta, nem eles. 

você diz: boa noite rapazes? olá queridos? meninos, como estão? gatos, e ai?

uma tênue barreira linguística nos separa, nos desajeita. há um paralelo em inglês, francês, iorubá para: bom dia! mas, não há um paralelo, não tão claro, acessível, como pode aparentar, para um bom dia entre homens e mulheres que se desconhecem. 

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dia 08/12 foi aniversário do rodrigo. 49 anos. fiquei pensando, na verdade torcendo, na verdade verdadeira acreditando que ele comemorou com um mágico, bolo colorido e fogos de artifício. que passa a maior parte do tempo rindo. que tem uma gata e um cachorro pequeno que são amigos. que no próximo final de semana vai sair feliz da vida, de mãos dadas com alguém e com o mundo. 

10/12/2025

 meu coração está descarrilhando

um peso enorme desce a angústia íngreme
depois das neblinas mais neblinas
e a queda nunca chega ao fim

ouço as vozes passando rapidamente por minha cabeça
vozes verdes, correndo na paisagem

estou indo para um horizonte sem paz
horizonte abalado por ondas e terremotos tristes 
horizonte trêmulo, sem linha que o conforte

pessoas soterradas pelo arco íris


jaquelien passou mal
verteu todos os poetas tristes de são paulo entre as pernas ensanguentadas
sintonizou no programa de rádio do pará: depois da chuva
canções do século passado, partes de sua infância
tomou dipirona e choro
adormecida, sonhou com a casa que tinha a noite dentro 

lourenço
achou uma árvore que dava lenços em vez de mangas
lenços brancos
de longe, os galhos da árvore pareciam braços 
acenando despedidas
para fernando

marinês 
subiu na mesa e ficou com vontade de tirar a calcinha
mas estava na casa da patroa
simplesmente ligou a máquina de lavar roupa
e ficou olhando se a porcelana ficaria mesmo 
muito branca

glauber esqueceu de ligar a câmera
não filmou a cara do bolsonaro tomando milk shake de morango
com petolinhas de sangue

todos torcem para que jasmim se recupere
de seu satanismo crônico cor de mel

silvia colocou algodões em suas garras
agora arranha 
a ternura dos dias
com discrição

todos os chicos estão deitados
sob a luz da lua
não se importam com o frio
são fortes
como as placas de gelo da antártida

alexandre abriu um pôr-do-sol
com os dentes

as mãos do tempo
enrolaram os cachos de marluce nos arames do minuto
é bonito o penteado
mas dói

duas adagas 
atacaram a jugular do bons modos
elas saíram das tatuagens de vanessa
e estão sendo procuradas por
homemcídio. 

reivane viu em dezembro 
uma revoada de cisnes azuis
tentou contar para os outros
mãe, pai, amigos da igreja
a revoada entrou por seus olhos, fez ninho em seu coração
a revoada canta músicas de redenção em sua alma
mas, ninguém acredita nela
dizem que pode ser o espírito santo
que ela confundiu com uma pomba

miguel pediu ao motorista do ônibus
que 
por gentileza
parasse em frente ao muro mágico com a inscrição:
"só para loucos"

michele,
ontem
pintou o mar
ondas calmas e infinitas
o mar começou a invadir sua sala
sua casa depois o quintal
michele precisou pintar um pequena bóia para se salvar
mergulhou fundo
buscou seus livros, o marido, a filha
todos ensopados 
pingando amor azul

vicentina acordou disposta
tomou café, comeu pão
e começou a xingar jeová
devido a antiga intimidade 

carolina quer ser um doce meloso
desses que escorrem pela boca
passam pela pele fina do pescoço 
e chegam aos mamilos
arrepiando-os 
com 
a devassidão do açúcar

rafa passou a noite colhendo as estrelas que não conseguiram brilhar
com delicadeza e calma
esticou sua ternura 
e colheu estrelas inteiras e as que estavam pela metade
as despedaçadas e as que choravam

os gêmeos escolheram cores diferentes para a esperança
isso foi uma novidade
miguel escolheu o verde
rafael escolher as folhas

tarik, tarik...
depois de um ano ficamos sabendo
fugiu com uma branca de neve
de palmas, no tocantis

joana desejou um tango, uma valsa, uma lambada que fosse
mas teve que ir para roça ainda criança
toda sua dança foi roubada 
pelos canaviais  
ao vento 

adelaide perdeu a virgindade em 10/12/2025
aos 36 anos de idade
rimbaud ressucitou só para deflorá-la

safiri começou conseguiu emprego com uma bruxa bem conceituada
agora tem carteira assinada e férias remuneradas
trabalha em uma loja de feitiços 
é uma boa vendedora de remédios obscuros 

raíssa desabotoou as pétalas de seus medos
sem machucar as frágeis flores do pânico
abriu com as pontas dos dedos 
rosas desesperadas
o perfume doce da angústia se dissipou
e ela resolveu fazer daquela imagem espantosa
uma estampa para sua saia

lidiane tomou umas vodkas a mais e disse verdades inconvenientes a elisete
disse que a amava, que gostava quando ela sorria
no outro dia, agiu como se nada tivesse acontecido
lesbianismo alcoólico 

augusto acabou de fazer um 
pão
e um 
poema
e uma 
música
e um
fogo fátuo. 

túlio se apaixonou por uma bela baleia 
está no fundo do fundo
aprendendo a cantar como ela
enquanto se afoga 
crescem escamas douradas em sua bondade

Joseph William Turner

25/10/2025

 a liberdade é uma bolinha dentro de mim

bola e rebola

para lá e para cá

desce do coração para os pés

atravessa minhas costelas

sobe do pulmão para os dentes


minha liberdade enche as nuvens de desenho

come macarrão com as mãos

arrasta a barriga na terra e suja minha calcinha de barro


a liberdade só dá conselhos que servem para mesma

conselhos que aprendeu com os gatos


olhando bem, a liberdade é mais parecida com preguiça 

do que com a motivação

a liberdade fica deitada a tarde

ou quando o sol está muito quente

depois vai ver a lua nascer


gosta de passear a dona liberdade

pelas folhas, pelas flores, pelas ruas

prefere ir a pé

do que de avião


a liberdade é um sentimento que dá quase para cortar com a faca

recortar com tesoura

mas não dá pra tatuar


os instrumentos musicais gostam muito da liberdade

os temperos

as cores também


a minha liberdade 

é uma velha

safada

16/10/2025

 


samba pra língua

 zambrólha zim zim

capotolenga lenguice

ain ma, ain me, ain u

zibidins zibilu

arrenca quebra

arrenca doça

trambelha 

paratins na fia

fique paradins

lamba o ar com a pele

 meninas 

enfiem os dedos nas tangerias sonhadoras

arranque as sementes com os dentes caninos 

gomo a gomo doçura a doçura mel a mel


  jesus apareceu pelado para mim

em sonho

carregava uma cesta de frutas e flores

aguava os suores das maçãs com toda uma ternura

andava com a bunda de fora 

entre nuvens e relâmpagos

não consegui definir se era pra sentir medo

ou êxtase

jesus parecia muito com um pedreiro que concertou o telhado da minha casa

quando eu era pequena

parecia ter mais de 33 anos 

sua barba brilhava com o pó da madeira 

pela feição de jesus

pensei que ele gostaria de escutar uma música

sugeri luis capucho


sem dor nem dó

os raios de sol

fazem o parto da manhã 

a despeito de qualquer guerra assassinato amazônia incinerada estupro fome

a rebentação das horas 

lava o céu com a glória e os matizes delicados do universo que recomeça

formigas escovam os dentes seres humanos vão ao trabalho

baratas adormecem homens abrem seus laptops

prostitutas ajeitam seus lençóis limpos donas de casa esticam suas mangueiras

crianças sonolentas coloquem uniformes bêbados adormecem sob as marquises

sem dor nem dó

cachorros espreguiçam-se conforme podem em suas coleiras

gatos lambem as patas diante do blindex

e toda luz matinal, pura como a esperança genuína

adentra nos olhos do que enxergam e dos que não enxergam

sem dor nem dó

as nuvens vão sendo trespassadas por mais um dia

iluminadas por dentro para que possam gerar tempestades inundações encher bueiros imundos

sem dor nem dó

o asfalto começa a se aquecer, lentamente

sem dor nem dó 

os matinhos esticam suas pontas

numa dança ereta que baila com a brisa do novo dia

sem dor nem dó 

os doentes quem vai se suicidar as mulheres que vão parir as vacas que vão parir os homens que vão abandonar os bebês os corruptos e os padres na primeira missa

todos

ganham este novo dia. 

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escreverei como que para ninguém

um alguém passou na esquina e esquivou-se da chateação de trombar uma poeta às 7h47

quer tomar um café, só não quer chegar atrasado para marcar o ponto

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